- Sente saudades de Angola?
Eu acho que agora que estou a envelhecer , sinto um bocado de saudades. (risos) Eu nunca senti propriamente saudades de Angola. Eu vim com 8 anos, lembro-me perfeitamente da terra, das sensações. Aliás, eu escrevo para crianças e tenho essas imagens presentes, esses cheiros porque é um país muito forte. África é muito forte e quando escrevo há sempre África na minha escrita.
- Como é que procura a inspiração para os seus livros?
Eu vou buscar inspiração ao mundo e aos meus filhos, também.
- Quando era criança, a Helena sonhava ser...
As crianças riem-se muito quando eu digo isto, porque eu queria ser cantora de ópera. Eu sempre quis ser cantora de ópera.
- No seu livro “No tempo em que os animais falam”, crianças da cidade vão entrar em contacto com animais. Pensa que as crianças da cidade não têm tanta noção do mundo natural como ele é?
Pois, ainda há crianças na cidade que dizem que as galinhas são depenadas, como vêm nos supermercados. Mas, estas crianças adoram o campo.
- Nessa mesma obra, apela ao sentido de igualdade entre as crianças. Sente que nos dias que correm, falta-nos a nós adultos esse sentimento o que se reflecte nas crianças?
Este livro, eu quando andei a apresentar este livro que saiu em 2010. As escolas elististas, de elite não queriam o livro. Porque eu misturo uma linguagem do campo com uma linguagem da cidade, portanto há pessoas que acham que é preciso distanciar. Quando eu acho que é preciso aproximar. Porque nós aprendemos muito com as crianças do campo e elas com as da cidade. Tal como nós adultos, também aprendemos muito uns com os outros.
E faz-nos bem porque as pessoas são diferentes, têm uma maneira de estar diferente. Pensam diferentemente, mas são livres. E nós nas cidades não somos livres, não temos aqueles campos... Precisamente o que eu encontrei em África, os horizontes. E que perdi aqui na Foz. Apesar de ter outros horizontes como o mar ou o castelo mesmo em frente que dava para eu sonhar. Não tinha aqueles horizontes vastos como os horizontes africanos ou os campos alentejanos que substituem os horizontes africanos. O Alentejo é muito África.
- É também professora, como surgiu a educação na sua vida ?
A minha mãe é educadora de infância, por isso, desde pequenina que eu estou dentro dos requisitos da educação. Eu sempre estive a par do que é ser professor e das dificuldades de ser professor.
- Como se passa do design de moda para o jornalismo e depois para pintura e artes? Considera-se a mulher dos 7 ofícios?
Não, está tudo ligado. O que eu fiz foi passar a escrever. Comecei a escrever sobre moda no Comércio do Porto. E como o Comércio do Porto fazia peças por várias partes do país, desloquei-me para Lisboa. Haviam muitos eventos e começavam a existir cada vez mais em Lisboa
Eu comecei a escrever sem formação nenhuma na área e tinha formação de moda e design de moda e comecei a coordenar esse artigo de moda do Comércio do Porto, quer dizer, de uma revista que saía no Comércio do Porto.
Em Lisboa foi muito fácil, eu entrei logo numa redacção. Foi uma questão de meses. Na altura da Abril Morumbi, que era um grupo brasileiro. E foi basicamente o grupo brasileiro, ou seja, essa experiência que me formou porque eu estive ali com os melhores. E eu tive a sorte de estar ali muitos anos, a trabalhar com os craques brasileiros e também depois, claro, sempre a tirar os cursos. Depois, fiz no CENJOR o curso geral para jornalistas, fiz televisão também no CENJOR. Tirei Estudos Europeus porque tinha a área de Relações Internacionais, e algo que eu gosto muito: política.
- Se tivesse que escolher só uma profissão, qual seria a eleita?
Só uma profissão? Escrever, claro. Eu seria só escritora.
- Para além disso, criou ainda uma editora de livros infanto-juvenis. No mercado de austeridade actual em que vivemos, é complicado gerir esse tipo de negócios?
É muito complicado, é tudo complicado. Eu também estou aberta a outros autores, mas o que eu faço é pedir apoios. Uma parte é financiada por mim. E outra parte é financiada com apoios de entidades que, por exemplo, compram X livros. E antes de lançar o livro, eu já tenho uma parte assegurada para não ter tanto prejuízo. Depois, as vendas não são muito significativas.
- A escrita é uma actividade lucrativa ou algo que faz por prazer?
A escrita já foi lucrativa. Eu agora escrevo pontualmente para a Exame, e até costumo dizer que em 98 escrevia artigos para a exame em que ganhava 70 contos na moeda antiga e agora ganho 20. Devia-se evoluir para o mais, e estamos a desvoluir para o menos (risos).
- Considera, então, que a cultura está doente em Portugal?
Está mesmo a zeros, quase.
- E quais são as medidas que se pode tomar em relação a isso?
Incentivá-los e educá-los, e é esse o meu projecto. No fundo, os meus livros têm tudo.
- Há pouco falávamos sobre artistas de renome que ilustraram as suas obras. Júlio Resende foi um deles. Como reagiu à sua morte?
Eu, por várias vezes, entrevistei o Júlio Resende, mas não era íntima. Conheci-o, tive inclusivamente uma experiência muito engraçada com ele porque o Júlio Resende é único. Quando eu estava a escrever para a Arquitectura e Construção e a Casa Claudia fui ao atelier dele porque fazia muitos ateliers de artistas. Fui ao atelier dele e ele recebeu-me num atelier amplo, fantástico, cheio de câmaras para me filmar. Quer dizer, isto é de mestre, eu era a jornalista, fui a casa dele, na altura tinha vinte e poucos anos e ele pregou-me uma partida. E, realmente foi uma entrevista lindíssima porque o Júlio Resende é um poeta, nao só na pintura, como na escrita e falava muito bem. E tudo o que falava era pensado. Claro, passado dez anos ou quinze comecei a escrever para crianças e lembrei-me logo do Resende. E ele aí fez outra coisa de mestre, porque ele estava muito doente, estava com tubercolose na altura e pensavam que ele nem ia resistir. De maneira que eu lhe enviei o texto e só queria que ele me cedesse pintura. Algumas daquelas pinturas que ele tinha feito anteriormente ilustravam perfeitamente a obra. E ele, leram-he o texto, porque ele não conseguia ler e ele disse: não, isto é uma obra de mérito. Eu quero fazer a ilustração para este conto. E então, ele colocou-se no lugar do rapazinho do livro. Ele começou em pequenino e ele pôs-se no lugar daquele menino, foi buscar papéis pequeninos como vão buscar, às vezes, as crianças e fez desenhos com lápis de cera, canetas de feltro, lápis de cor, todos os materiais que usam as crianças. Ele pôs-se no lugar de uma criança. Portanto, eu acho que isto tem muito valor. São estas coisas, estas pequenas coisas que fazem com que as pessoas sejam diferentes e que se destaquem num mundo tão cheio como o nosso. E, realmente, o Resende tinha estas magias.
- Vai continuar a escrever e a publicar?
Sim, espero bem que sim.
- Nesta fase da sua vida, sente que há alguma coisa que ficou por fazer?
Não sei, acho que há sempre coisas por fazer...
- E quais são os principais projectos que tem agora para o futuro?
Bom, eu gostaria muito de terminar o doutoramento. Não sei se vou conseguir. (risos). E também já fiz tentativas de ir com os meus livros para fora, o que também não sei se vou conseguir. Porque é difícil. Eu tenho alguns amigos espalhados pela Europa, em Zurich, Berlim, Lyon e que têm sugerido: olha esta livraria, ou aquela. E então os livros têm ido lá para fora. Mas não em apresentações e eu gostaria que os livros tivessem mais visibilidade lá fora. No fundo, os livros que eu faço são obras de arte, tem os artistas. Os meus livros são todos numerados e autografados. Já para ensinar os meninos que os livros são obras de arte. Não se podem estragar!
Claro que eu tenho muitas ideias e muitos projectos, mas é preciso viabilizá-las. Eu tenho outra ideia, de outra revista. Mas preciso viabilizá-la, porque os grandes grupos não querem fazer nada. Eles dizem: nós não queremos fazer nada, nem damos o dinheiro. Eles apenas dizem: damos a imagem de marca e vocês que façam tudo. Portanto, não querem ter chatices. E é preciso realmente ser empreendedor.
Eu acho que agora que estou a envelhecer , sinto um bocado de saudades. (risos) Eu nunca senti propriamente saudades de Angola. Eu vim com 8 anos, lembro-me perfeitamente da terra, das sensações. Aliás, eu escrevo para crianças e tenho essas imagens presentes, esses cheiros porque é um país muito forte. África é muito forte e quando escrevo há sempre África na minha escrita.
- Como é que procura a inspiração para os seus livros?
Eu vou buscar inspiração ao mundo e aos meus filhos, também.
- Quando era criança, a Helena sonhava ser...
As crianças riem-se muito quando eu digo isto, porque eu queria ser cantora de ópera. Eu sempre quis ser cantora de ópera.
- No seu livro “No tempo em que os animais falam”, crianças da cidade vão entrar em contacto com animais. Pensa que as crianças da cidade não têm tanta noção do mundo natural como ele é?
Pois, ainda há crianças na cidade que dizem que as galinhas são depenadas, como vêm nos supermercados. Mas, estas crianças adoram o campo.
- Nessa mesma obra, apela ao sentido de igualdade entre as crianças. Sente que nos dias que correm, falta-nos a nós adultos esse sentimento o que se reflecte nas crianças?
Este livro, eu quando andei a apresentar este livro que saiu em 2010. As escolas elististas, de elite não queriam o livro. Porque eu misturo uma linguagem do campo com uma linguagem da cidade, portanto há pessoas que acham que é preciso distanciar. Quando eu acho que é preciso aproximar. Porque nós aprendemos muito com as crianças do campo e elas com as da cidade. Tal como nós adultos, também aprendemos muito uns com os outros.
E faz-nos bem porque as pessoas são diferentes, têm uma maneira de estar diferente. Pensam diferentemente, mas são livres. E nós nas cidades não somos livres, não temos aqueles campos... Precisamente o que eu encontrei em África, os horizontes. E que perdi aqui na Foz. Apesar de ter outros horizontes como o mar ou o castelo mesmo em frente que dava para eu sonhar. Não tinha aqueles horizontes vastos como os horizontes africanos ou os campos alentejanos que substituem os horizontes africanos. O Alentejo é muito África.
- É também professora, como surgiu a educação na sua vida ?
A minha mãe é educadora de infância, por isso, desde pequenina que eu estou dentro dos requisitos da educação. Eu sempre estive a par do que é ser professor e das dificuldades de ser professor.
- Como se passa do design de moda para o jornalismo e depois para pintura e artes? Considera-se a mulher dos 7 ofícios?
Não, está tudo ligado. O que eu fiz foi passar a escrever. Comecei a escrever sobre moda no Comércio do Porto. E como o Comércio do Porto fazia peças por várias partes do país, desloquei-me para Lisboa. Haviam muitos eventos e começavam a existir cada vez mais em Lisboa
Eu comecei a escrever sem formação nenhuma na área e tinha formação de moda e design de moda e comecei a coordenar esse artigo de moda do Comércio do Porto, quer dizer, de uma revista que saía no Comércio do Porto.
Em Lisboa foi muito fácil, eu entrei logo numa redacção. Foi uma questão de meses. Na altura da Abril Morumbi, que era um grupo brasileiro. E foi basicamente o grupo brasileiro, ou seja, essa experiência que me formou porque eu estive ali com os melhores. E eu tive a sorte de estar ali muitos anos, a trabalhar com os craques brasileiros e também depois, claro, sempre a tirar os cursos. Depois, fiz no CENJOR o curso geral para jornalistas, fiz televisão também no CENJOR. Tirei Estudos Europeus porque tinha a área de Relações Internacionais, e algo que eu gosto muito: política.
- Se tivesse que escolher só uma profissão, qual seria a eleita?
Só uma profissão? Escrever, claro. Eu seria só escritora.
- Para além disso, criou ainda uma editora de livros infanto-juvenis. No mercado de austeridade actual em que vivemos, é complicado gerir esse tipo de negócios?
É muito complicado, é tudo complicado. Eu também estou aberta a outros autores, mas o que eu faço é pedir apoios. Uma parte é financiada por mim. E outra parte é financiada com apoios de entidades que, por exemplo, compram X livros. E antes de lançar o livro, eu já tenho uma parte assegurada para não ter tanto prejuízo. Depois, as vendas não são muito significativas.
- A escrita é uma actividade lucrativa ou algo que faz por prazer?
A escrita já foi lucrativa. Eu agora escrevo pontualmente para a Exame, e até costumo dizer que em 98 escrevia artigos para a exame em que ganhava 70 contos na moeda antiga e agora ganho 20. Devia-se evoluir para o mais, e estamos a desvoluir para o menos (risos).
- Considera, então, que a cultura está doente em Portugal?
Está mesmo a zeros, quase.
- E quais são as medidas que se pode tomar em relação a isso?
Incentivá-los e educá-los, e é esse o meu projecto. No fundo, os meus livros têm tudo.
- Há pouco falávamos sobre artistas de renome que ilustraram as suas obras. Júlio Resende foi um deles. Como reagiu à sua morte?
Eu, por várias vezes, entrevistei o Júlio Resende, mas não era íntima. Conheci-o, tive inclusivamente uma experiência muito engraçada com ele porque o Júlio Resende é único. Quando eu estava a escrever para a Arquitectura e Construção e a Casa Claudia fui ao atelier dele porque fazia muitos ateliers de artistas. Fui ao atelier dele e ele recebeu-me num atelier amplo, fantástico, cheio de câmaras para me filmar. Quer dizer, isto é de mestre, eu era a jornalista, fui a casa dele, na altura tinha vinte e poucos anos e ele pregou-me uma partida. E, realmente foi uma entrevista lindíssima porque o Júlio Resende é um poeta, nao só na pintura, como na escrita e falava muito bem. E tudo o que falava era pensado. Claro, passado dez anos ou quinze comecei a escrever para crianças e lembrei-me logo do Resende. E ele aí fez outra coisa de mestre, porque ele estava muito doente, estava com tubercolose na altura e pensavam que ele nem ia resistir. De maneira que eu lhe enviei o texto e só queria que ele me cedesse pintura. Algumas daquelas pinturas que ele tinha feito anteriormente ilustravam perfeitamente a obra. E ele, leram-he o texto, porque ele não conseguia ler e ele disse: não, isto é uma obra de mérito. Eu quero fazer a ilustração para este conto. E então, ele colocou-se no lugar do rapazinho do livro. Ele começou em pequenino e ele pôs-se no lugar daquele menino, foi buscar papéis pequeninos como vão buscar, às vezes, as crianças e fez desenhos com lápis de cera, canetas de feltro, lápis de cor, todos os materiais que usam as crianças. Ele pôs-se no lugar de uma criança. Portanto, eu acho que isto tem muito valor. São estas coisas, estas pequenas coisas que fazem com que as pessoas sejam diferentes e que se destaquem num mundo tão cheio como o nosso. E, realmente, o Resende tinha estas magias.
- Vai continuar a escrever e a publicar?
Sim, espero bem que sim.
- Nesta fase da sua vida, sente que há alguma coisa que ficou por fazer?
Não sei, acho que há sempre coisas por fazer...
- E quais são os principais projectos que tem agora para o futuro?
Bom, eu gostaria muito de terminar o doutoramento. Não sei se vou conseguir. (risos). E também já fiz tentativas de ir com os meus livros para fora, o que também não sei se vou conseguir. Porque é difícil. Eu tenho alguns amigos espalhados pela Europa, em Zurich, Berlim, Lyon e que têm sugerido: olha esta livraria, ou aquela. E então os livros têm ido lá para fora. Mas não em apresentações e eu gostaria que os livros tivessem mais visibilidade lá fora. No fundo, os livros que eu faço são obras de arte, tem os artistas. Os meus livros são todos numerados e autografados. Já para ensinar os meninos que os livros são obras de arte. Não se podem estragar!
Claro que eu tenho muitas ideias e muitos projectos, mas é preciso viabilizá-las. Eu tenho outra ideia, de outra revista. Mas preciso viabilizá-la, porque os grandes grupos não querem fazer nada. Eles dizem: nós não queremos fazer nada, nem damos o dinheiro. Eles apenas dizem: damos a imagem de marca e vocês que façam tudo. Portanto, não querem ter chatices. E é preciso realmente ser empreendedor.